Um jacaré desbotado

Foto tirada na janela do apartamento de Nélio Rezende e Altevir Rezende. (jornal O Liberal)

Meus amigos e leitores mais antigos sabem que eu realizei umas andanças pelo Brasil em busca da verdadeira história da Guerrilha do Araguaia. Um dos episódios mais vergonhosos do regime militar brasileiro. 

Corri Amazônia adentro procurando as histórias de ribeirinhos, camponeses, militares e todos os que viveram o triste período da guerrilha em terras do bico do Papagaio.

Nessas viagens conheci muita gente boa. Muita gente disposta a ajudar com a reconstrução da história que tentaram apagar dos registros brasileiros.
Em Belém, conheci um ex-tenente, um geólogo, que fora um dos primeiros a entrar na área de guerrilha. E um dos seus homens, o cabo Rosa, teve sua vida ceifada pelo tiro de um guerrilheiro do PCdoB.

Não foi fácil encontrá-lo, muito menos convencê-lo a nos contar sua história, mas passada a primeira barreira, ganhei um amigo querido. 
Junto com esse amigo, veio a família dele, que também se tornou minha amiga.
Nélio, o ex-oficial do Exército tem um irmão que é uma figura, o Altevir. Ele foi um grande parceiro de trabalho, pois me guiou pelas ruas de Belém, foi comigo até os locais e me ensinou muito da cultura Paraense. 

Acontece que Altevir não estava acostumado com o meu jeito despojado e quase mal-educado, de falar o que penso.
Estávamos os dois descendo no elevador do prédio - eles moravam no 15º andar - para assistir ao Círio de Nazaré, da sexta-feira à noite.
Uma senhora, muito elegante, com sua filha entra no elevador logo depois de nós. 
Meu amigo, muito educado, elogiou a senhora dizendo que ela estava muito bonita e chique. 
-Uma bolsa muito bonita a sua, disse ele. Parece até couro de Jacaré.

Eu olhei a senhora, reparei os cabelos bem penteados, unhas feitas, roupa elegante, e quase concordei com o Altevir. Foi então, que olhei a bolsa. E uma crise de riso se avizinhou.
Para não soltar a gargalhada que vinha crescendo na garganta, eu sapequei a frase:
- Muito elegante mesmo, mas o jacaré era meio desbotado, né?

A senhora, a filha dela e o Altevir me olharam com olhos de fuzil. Na mesma  hora me arrependi de ter aberto a boca.

Estávamos ainda no 10º andar por aí... E o resto da viagem foi em um silêncio constrangedor.
Quando saímos porta do prédio afora, meu amigo pegou no meu braço e, como bom paraense disparou:
- Égua da moleca! Nunca mais eu pego elevador contigo!!!!

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Para quem quiser ler a entrevista que dei ao jornal O Liberal, do Pará, eis o link.
http://operacaoaraguaia.blogspot.com/2008/05/entrevista-com-tas-morais-em-o-liberal.html

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