Pra falar sobre responsabilidade ou a corrosão dela nos tempos atuais, fiquei pensando em minhas fontes culturais e da vida real.
Vocês já viram como a maioria de nós se utiliza de várias e velhas " desculpas " para justificarmos determinadas atitudes : " É assim que eu sou ". Não há dúvida que o temperamento( uma combinação de herança genética, influências familiares e fatores culturais ) estimula atitudes, estados de comportamento e humor, e é extremamente difícil de controlar quanto mais de mudar permanentemente . A psicologia define isso como "set point ". Mas, além do temperamento existe o caráter. Temperamento é o que você é, caráter é o que você faz . Concordam ? Temperamento é dado, caráter pode ser forjado. Podemos de certa forma nos opor aos ditames do temperamento e se agirmos de maneira diferente por tempo suficiente, o novo comportamento, segundo psicólogos, vai estabelecer suas próprias conexões cerebrais.
A palavra caráter entretanto, tem um tom fora de moda. Nossa era de prerrogativas de direito não procura caráter, que exige obrigação, mas sim identidade, que requer direitos ( quantas vezes falamos " eu me identifico com fulano ou cicrano ). A identidade pode ser encontrada no dinheiro, no status ou na celebridade, mas é mais facilmente conferida pelo sentimento de pertencer a um grupo - em geral baseado em etnia, raça, religião ou orientação sexual. O grupo será especialmente atraente se puder alegar ter sofrido injustiça. Então seus membros podem ser vítimas e desfrutar o luxo de ter quem culpar. E a culpa é a nova solução para a incapacidade contemporânea de aceitar a má sorte aleatória. Recentemente fiquei sabendo que há algum tempo atrás o British Medical Journal tentou banir a palavra " acidente " do léxico da língua inglesa. Pasmem. Essa incapacidade de aceitar a casualidade é o que torna as teorias conspiratória tão atraentes ( em tempos de pandemia e brigas ideológicas jamais se viu tantas teorias desse tipo ). Essas teorias investem o banal e aleatório de glamour e significado e jogam a culpa pela irresponsabilidade pessoal sobre forças sinistras e secretas . O problema de mudar o foco da responsabilidade é que hoje ninguém está preparado para aceitar a culpa.
A consequência inevitável desse relativismo é uma fatal perda de coragem - torna-se impossível defender valores e fazer juízos de valor. Nos litígios, murmuramos que há muito o que dizer em favor das duas partes. Em conflitos políticos , achamos que um lado é tão ruim quanto outro, e quanto a políticos que os dois são igualmente ruins. Vemos pessoas tomarem tolas decisões que inevitavelmente levarão ao desastre, mas não dizemos nada. " Não tenho o direito de me meter " ou " Meu conselho será rejeitado ", " Isso só causaria discórdia " e " Afinal, que eu sei sobre isso " entre tantas outras...
Poderia discorrer muito mais aqui sobre a ética tão relegada ao legalismo do tipo : concordo em fazer isso se você concordar em fazer aquilo; mas isso é para um outro texto...
Já viram como transferimos cada vez mais responsabilidades para um cada vez maior número de consultores, gurus, instrutores, terapeutas e os tais " life coaches" ?
Tenhamos então mais coragem para estancar essa corrosão da responsabilidade pessoal, pois só ela traz satisfação...
É assim que eu sou ...
Por Ademir Silva
O velho discurso do “é assim que sou” me cansa. As pessoas são, na verdade, egoistas. Egoístas ao ponto de exigirem que as outras as aceitem com todos os defeitos. Mudar para melhor não é cogitado. É isso me irrita. Boa reflexão, Ademir.
ResponderExcluirJá escutei muito sou assim porque fui criado desta maneira e outras coisas do tipo. Pois bem, tendo consciência já é o primeiro passo para mudança, eu sou a prova que as pessoas podem mudar. Em relação a culpa isso é inerente ao ser humano, é muito mias fácil culpar alguém do que admitir seus próprios erros ou de outros entes queridos. Culpar alguém nos eximem da responsabilidade colocando num bode expiatório toda nossa insatisfação. Por acaso você lembra de alguém nesse sentido? Alguém que podemos colocar a culpa e ficarmos bem?
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