![]() |
Relíquia da casa das Tias |
Por que guardamos a felicidade?
Desde pequena eu me pergunto isso, nunca entendi o motivo da cristaleira da casa da minha avó, onde eu também morei uma parte da vida, estar repleta de louças bonitas, novas e as gavetas recheadas de talheres desenhados e brilhantes.
No guarda-roupas também era assim, lençóis milimetricamente dobrados com suas fronhas e claro, intocáveis.
As roupas de uma das minhas tias era outra particularidade, algumas ensacadas, embaladas em papel de seda branco, onde o guarda-roupas exalava naftalina.
Ela falava com orgulho de cada uma, as que ela não usava mais mas que adorava, outras que ela usou muito (uma forma de rememorar o passado) e ainda, aquelas que ainda caberiam nos seus 10 quilos que teimavam não ir embora, quando os perdesse, claro.
Quando eu perguntava o porquê não usávamos tudo aquilo, me respondiam: "é para quando recebermos visita" "essa é para uma ocasião especial", "esses lençóis são muito caros"...
Eu nunca entendi, já que recebíamos quase nunca visitas e as que vinham, eram amigos próximos que toda semana estavam por lá, elas quase não saiam e, ora, se são peças caras, comprou para não serem usadas?
Eu achava aquilo um desperdício.
E não é?
Ano passado fui visitá-las e pude observar que as mesmas louças e enfeites da minha infância, estavam lá, trincados, velhos e a casa era a imagem da decadência.
Para que guardaram tudo aquilo, para envelhecerem com eles?
Algumas pessoas não sabem a felicidade que é poder usar um prato novo, ou aquela roupa que você namorou na vitrine da loja, poder arrumar a mesa do café da manhã, mesmo que seja só para você. E daí que não tem mais ninguém? Tem você ali.
Se desperdiça tanto a felicidade...
Sou adepta à pequenas porções, sabe?
A felicidade em escrever para alguém, em preparar aquele bolo e comer com vontade, sentar e começar aquele livro, telefonar para alguém que queira bem, assim, do nada, marcar um café com as amigas, afagar seu cachorro, beijar seu filho ou dizer à alguém um bom dia, mesmo que nunca tenha visto a criatura na vida.
São pequenas coisas, entende?
O desinteresse, a pressa, muitas vezes o medo faz com que deixemos pra lá, mas se não fôr agora, talvez, a roupa fique apertada, o copo trinque, o salto quebre, o tempo acabe ou a louça lasque e, de repente você se veja tomando o café naquela xícara lascada e percebe que está morno e o gosto não é mais o mesmo.
Olha a felicidade, ela está aí, mas insistimos em guardá-la na gaveta para uma ocasião especial sem nos lembrar que a ocasião especial, quem faz, somos nós.
Seja feliz, agora.
Em pequenas porções diárias, ou tudo de uma vez, você escolhe.
Eu tenho como ideia usar tudo, não guardo nada para posteridade. Vivo o hoje com o que tem de melhor. Bela reflexão.
ResponderExcluirEu tb, Xandi! Deixo nada para depois, só quando não tem jeito.
ExcluirViva o hoje, o resto é história!
ResponderExcluirAmei o texto, Quel !
Bom fim de semana!
Pra ti também, querido!!!!
ExcluirPerfeito! Minha mãe tinha a mesma mania. Porcelanas que ganhou no casamento com meu pai ficavam intocadas nas caixas. Depois viraram enfeites empoeirados. Ela se foi. Tudo ficou. Saibamos ser e ter o hoje. Sem esperar o amanhã, que talvez não chegue. Te beijo!
ResponderExcluirAinda mais esse ano que nos ensinou que a vida vai assim, sem esperarmos. ❤️
ExcluirMuito lindo o texto. Muito verdadeiro também. Acho difícil de explicar essa "lógica" do uso seletivo das coisas, bem como da acumulação. Tantas são as explicações de cunho psicológico... nenhuma me convence muito.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ExcluirPior que sempre existe uma "lógica", mesmo que não a entendamos. A vida, as pessoas e suas idiossincrasias...
ResponderExcluirBeijo!
Que texto delicioso !
ResponderExcluir