O normal não é normal.

 








Logo que cheguei aqui nos Estados Unidos, uns bons anos atrás, eu costumava caminhar até a estação ferroviária. E, lá pegava o trem que me levava até as cidades vizinhas da que eu morava.
No dia em que esse fato ocorreu, eu repetia aquela rotina, eram 6:30 da manhã, eu estava caminhando pelas ruas ainda escuras daqui, o chão ainda guardava os resquícios da chuva da madrugada.
Percebi a presença de um homem alto, vestido com roupas escuras, alguns metros atrás de mim e meus instintos cariocas me fizeram automaticamente acelerar o passo em minha caminhada.
Ao fazer isso, senti que o homem também acelerou a passada e começou a se aproximar perigosamente de mim, usei o fato de atravessar uma rua, para rapidamente olhar para trás e checar o possível serial killer que iria arrancar minha pele e usá-la para costurar um lindo casaco e presentear a mãe dele que morreu há quinze anos atrás e está mumificada em sua cama. Pior foi perceber que logo depois que atravessei a bendita rua senti que ele tinha se aproximado mais e perigosamente !

Então escutei sua voz :

"- Hey , Man ! "

Virei rapidamente usando minha técnica ninja-gato assustado, e  era tarde demais ! Eu só tive tempo de perceber o metal frio na mão dele, que tinha sido mais rápido. E, antes que eu pudesse me defender ou argumentar algo ...ele me disse :

" - O senhor deixou cair suas chaves ao atravessar a rua ."

Agradeci à ele, desejei um bom dia e cada um seguiu seu caminho.

Eu nunca entendia o fato das vítimas nos filmes americanos, caminharem até o assassino. A ingenuidade dos assaltados, a perplexidade dos personagens ao serem atacados.
Com o passar do tempo percebi que esse comportamento era a fiel representação do que acontece aqui.
Nós brasileiros, que vivemos em grandes cidades é que nos habituamos com a violência, com os 60 mil assassinatos e com os 200 mil “desaparecidos” anuais.
Nos acostumamos a sermos caçados, a não poder usar relógios e jóias. A esconder celulares e evitar certas regiões à noite.
O brasileiro se acostumou a pagar “proteção “ pra milícia, conviver com traficantes.
Se acostumou a ficar aflito esperando seus entes amados voltarem do trabalho, escola, festas, etc.
Culpa do Estado. 
E, isso fez criar uma “casca” em nosso povo, um instinto de auto-preservação, uma malandragem que não encontramos em países do primeiro mundo. Lugares aonde a violência é exceção, e não faz parte do cotidiano.
Eu já tive parente sequestrado dentro de casa, amigos assassinados em assalto e os assaltos de que familiares e amigos foram vítimas são incontáveis! Mas, infelizmente as pessoas acham isso algo normal.
Não, isso não é normal. 
O normal é sacar dinheiro no caixa eletrônico e sair contando. O normal é deixar o celular em cima da mesa no restaurante. O normal é parar em sinal de trânsito na madrugada e não ser assaltado.
Como eu sei que o Brasil não vai mudar, que as leis vão continuar permitindo que assassinos sejam libertados após 5 anos presos entre outras bizarrices...eu gostaria sugerir que aqueles que possuem recursos mudem para o interior do país ou para fora do país.
Mudem para uma cidadezinha aonde você possa deixar a porta da frente aberta, para um país aonde você não fique desesperado(a) esperando o retorno do seu filho. 

Sei que nem todos(os que querem)podem fazer isso, pois possuem família, trabalho e outras âncoras que os prendem aos grandes centros brasileiros. Mas, se você puder fazer isso, não pense duas vezes. Preserve a sua sanidade física e mental. Preserve a sua família. Não espere que algo ruim aconteça para agir.

Quanto à mim, infelizmente os traumas que sofri no passado ainda me deixam “bolado” em determinadas situações. Mas, já sou uma pessoa bem mais “normal” que antes. Não tenho mais medo de assaltos... Mas, ainda mantenho meu medo de Serial Killers e Fantasmas.

Comentários

  1. Bah Allan, sinceramente meu sonho é conseguir sair para caminhar a noite com a certeza de segurança. Na verdade nem consigo imaginar isso...

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  2. Seria sensacional andarmos põe aí tranquilamente, apreciando a noite, o entardecer ou bem cedinho, dar aquela corridinha se leve.... Que sonho.

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  3. Muito bom texto. Por óbvio, não há como refutar suas consideraçãoes na totalidade, porém considero que as tintas estão ou carregadas, ou pálidas. Se falássemos de alguns países nórdicos até consideraria concordar plenamente, mas em se tratando de USA, não. Certas cidades, como Washington, são muito violentas; com índices elevados para padrões de primeiro mundo. O Brasil não é o Rio de janeiro.

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